Quando chegamos em Tokyo eu achei que ia amar. Adoro comida japonesa, meu sogro ia estar revendo suas raízes, já tinha ouvido falar coisas maravilhosas sobre a cidade...
Mas a realidade é que eu odiei. Já dizia Caetano que Narciso acha feio o que não é espelho, e como eu estava me sentindo uma alien em meu próprio corpo - com todas as dores esquisitas de uma primeira gravidez - eu ansiei por alguma coisa conhecida.
Então em vez de curtir a viagem, eu fiquei notando todas as diferenças. Os homens na rua, todos vestidos com a "farda" de terno de risca de giz preta com camisa branca. Todo mundo fumando. O passo rápido. As máscaras cirúrgicas. Todo mundo falando baixinho, com a maior educação do mundo, mas sem nenhuma compaixão. Ninguém comendo na rua, nem picolé. Uns dias o sol tava de rachar, outros dias a chuva não parava.
Mas o fundo do poço foram as crianças. Toda vez que entrava no metrô tinha um menininho de dois anos me encarando como se nunca tivesse visto uma pessoa de olho grande na vida. Uma menina no meu hotel ficou com tanto medo quando me viu que se agarrou na perna da mãe. Eu me senti tão estrangeira que não via a hora de voltar.
E então chegou a viagem pra Kyoto. Eu entrei no trem cansada, querendo que todo mundo fosse a merda. Abri meu livro em inglês e me fechei pro mundo. Até que Tânia levantou pra tirar foto do Monte Fuji. A gente estava do lado errado do trem, e todos os assentos do lado certo estavam cheios. Lá vai Tânia pro fundo do trem ver se achava uma janela que não tivesse ninguém, porque afinal de contas você não pode invadir o espaço pessoal dos japoneses.
Foi aí que notei a velha sentada na janela olhando pra mim. Ela fez menção pra eu sentar do lado dela. Eu peguei a câmera e fui. Ela fez menção de levantar, pra me dar o lugar dela. E eu ainda estava com tanta raiva no coração que mencionei com a cabeça que não fazia questão. Aí ela me olhou no olho, segurou meu braço, e apontou pra janela. Era como se ela soubesse que eu precisava ver aquilo. Eu me virei, e lá estava o monte.
Fiquei olhando embasbacada, tirei umas fotos, e depois mostrei a velha que eu tinha capturado a cena. Ela me olhou nos olhos de novo, com um sorriso no rosto, como quem diz "passou no teste". E isso me deu uma paz. Uma paz que permeou o resto da viagem, e me fez curtir tanto Kyoto quanto Tokyo.
De que adianta ter o olho grande se a gente vai passar a vida com ele fechado. Obrigada, velha, por me fazer enxergar.
Muito bom!!!
Posted by: Milena | 04/07/2010 at 06:50 PM
Pode ser sempre assim!Quando a gente menos espera,o "cosmo" conspira e nos mostra coisas lindas,como esta,pelo olhar de alguem...velho ou não!
Posted by: eda | 11/07/2010 at 05:56 PM