Eu tenho vagas mémorias de uma viagem pro Piauí, quando eu era pequena. A gente tinha ido passar as férias na casa de meu pai, ver os primos e a fazenda. Não me lembro de quase nada, mas tenho essa idéia da viagem de volta, sentada no carro no banco de trás, atráz de meu pai. O vento na cara, que meu pai sempre ia pela BR com o vidro da janela arriado, olhando a vastidão que é o sertão nordestino. Marrom do lado de lá, marrom do lado de cá. Um mandacaru aqui e ali.
Até que meu pai disse: "Tá vendo ali, filha? Tá desfiando chuva." Olhei pra frente pra ver uma nuvem escura, com um fiapo de água que se via de longe, naquela imensidão árida. Mais pra frente as nuvems ficaram mais fechadas e meu pai me perguntou: "Já pensou como deve ser tocar numa nuvem?" e meti a cara entre os bancos da frente pra ver o rosto de meu pai, o retrato misto de nostalgia e fascinação, coisa que só sente quem cresceu com a seca e sabe o valor de cada gota de água.
No feriadão de Labor Day a gente foi pra Tahoe. E do alto da montanha de Squaw, a 9 mil pés de altura, olhei pro horizonte e dei de cara com a chuva desfiando. E quando senti o vento do topo da montanha batendo na cara, em vez de entrar e proteger Tiago do tempo, resolvi sentar na beira do precipício e dar comida pra ele, olhando a chuva cair em fiapos sobre a floresta lá em baixo. Eu não sofri com a seca, mas a saudade de meu pai é grande.
Tiago, quando você crescer e ver um tiquinho de água escorrendo do céu, que você se lembre de sentir o vento na cara e saber que seu avô - e sua mãe - te amam.
Se lembra ano passado quando eu dirigi 700km pra comer umas costelinhas de porco? Não era desejo de grávida! Então esse ano fomos de novo, com Tiago e vovô Dinha, ver o poder que um pouco de vinagre, pimenta e melaço têm sobre um pedacinho de carne porco.
O marido aprovou, dizendo que a carne tava soltando do osso.
A avó aprovou, dizendo que as costelinhas nem eram tão gordas asssim.
Meu filho aprovou, se volutariando a dividir a minha porcão.
Eu achei que estava no paraíso. Acho que isso é o começo de uma tradição familiar.
Meu filho é um menino crescido. Com direito a calça jeans e sapato, e camisa de botão. E brinquedos novos tipo Bacon, o porquinho super fofo.
No começo do mês meu leite foi acabando e toda vez que eu levava a bomba pro trabalho e mal conseguia tirar 80ml me batia uma deprê. Aí eu passei a só dar peito de manhã e à noite, mas depois acabou o leite da noite e finalmente acabou o leite da manhã. 80ml não enche nem o buraco do (não) dente, pra um menino que toma 180ml.
Mas tentei me concentrar no fato de que ele está saudável (só pegou um resfriado leve quando a gente foi pra Espanha) e que ele come de tudo. E por "tudo" eu quero dizer feijão com carne e abóbora, lentinha temperada com garam masala e beringela temperada com curry. E de sobremesa rola um pêssego inteiro, misturado com banana. Ou então maçã assada com aveia e canela, misturada com iogurte integral. Comida tá fria? Não tem problema. O menino é como dizia meu pai, "meu prato preferido é o cheio".
Um minuto para dar um aviso a todo mundo que acha que ele está gordinho: o moço chegou do pediatra ontem e bateu 9,3kg, também conhecido como percentil 50. Isso mesmo: o rapaz está na média de peso de todas as crianças do tamanho dele. A propósito, a altura também está na média, com 72,5cm.
Com esse rango todo na pança, quem sofre são os pais, a babá e a vó, que tem que passar o dia com o corpo dobrado pra levar o menino de um lado pro outro da casa. Agora eu quero ver a janela. Agora eu quero pegar a comida dos gatos. Agora eu quero pegar o seu computador. Agora eu quero o seu celular. Agora eu quero virar todos os meus brinquedos no chão. Agora eu quero tirar todos os livros da estante. Agora eu quero ir atrás de Gilberto. E se a gente não quiser levar? AAAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHH é o grito que ele dá.
Diz minha mãe que menino que anda não fala e menino que fala não anda. Me parece verdade, porque a única coisa que ele diz é "AAAAAAHHHHHHH" ou "OOOOOOOOOHHHHHHH", quando alguma coisa que ele quer pegar não está ao alcance. É a dica que a gente tem que segurar as mãos dele pra ele poder andar até lá. Ontem tive um sonho que ele falou "papai", mas acho que vai demorar até o sonho se materializar.
No mais, ele aprendeu a sacudir a cabeça como quem diz não, aprendeu a bater palmas, e continua rindo quando eu espirro. E morre de saudade da vovô Dinha, que passou umas semanas com ele.
Pois é. Muita novidade. O que não muda é que eu continuo apaixonada por ele :-)
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