Meu filho preto virou estrelinha. Na minha mão, as 3:10am de 24 de outubro de 2012.
Beto, meu coração é um buraco de saudade de você, e não sei que dia eu vou conseguir parar de chorar. Todo lugar que eu olho eu lembro de você, e a casa é vazia sem o seu miado. Que você esteja num lugar melhor, livre de dor, deitado num lugar alto com sua pata pra frente.
64 dias, Beto. A internet tinha me dito 79. Minha mãe me disse "filha, ia acontecer mais cedo ou mais tarde". Mãe, eu queria que fosse mais tarde. A gente não devia ver os filhos morrer, mesmo que os filhos sejam de quatro patas.
Essa foto eu tirei antes de dizer adeus. Ele estava lúcido, e não queria estar no veterinário. Ele sabia que alguma coisa ruim estava pra acontecer. Calmo, como sempre. Amável, como sempre. E atento. Mas o pulmão dele estava comprometido. Uma hora da manhã, quando a médica veio dar o resultado do raio-x, eu sabia que era o fim:
Eu vi o raio-x, Sra Dantas. São tantos nódulos de câncer que eu não consegui contar. E ele está com fluido nos pulmões, é por isso que ele não consegue respirar direito e o ronronar dele faz esse barulho estranho. Eu posso fazer uma punção pra tirar o líquido - isto pode dar um alívio a ele porque ele vai conseguir encher o pulmão de ar. Mas ele está gravemente anêmico, e dada a velocidade do desenvolvimento da doença, eu tenho medo dele precisar de outra punção em uma semana. Está na hora da gente conversar sobre o fim da vida dele.
Eutanásia. Coisa que eu me lembro de conversar com meu pai tantas vezes - "Pai, se a pessoa tá sofrendo a gente devia poder dar um fim na dor. Não tem por quê extender o inevitável". Mas quando me deram o papel pra assinar, quem disse que eu consegui? Demorou 2 horas pra eu ter coragem. Eu tentei convencer a médica de trazer ele pra casa, deixar a natureza agir. Mas ela não deixou:
Sra Dantas, um animal com câncer não é a mesma coisa que uma pessoa com câncer. Uma pessoa vai estar medicada, com oxigênio do lado, com a dor sob controle. Seu gato vai sufocar. Ele pode durar uns dias a mais, mas ele vai morrer afogado.
E você olhou pra mim e eu não tive coragem. Foi preciso conversar com Yudi, que ligou pra minha mãe, que ligou pra mim com Eda, e Lua. "Minha filha, você fez tudo o que você podia fazer. Esse câncer é muito invasivo".
Eu desliguei o telefone, e disse OK pra médica. Uma injeção de sedativo. Você deitou quietinho, eu disse "tchau, meu amor. você vai ficar bem, a dor vai passar já já." Uma injeção de pentobarbital e seu coração parou. O meu também, mas só por uns segundos.
Quando eu entrei no carro pra voltar pra casa tudo me pareceu errado. Dei a chave na ignição e o rádio do carro começou a tocar Time, do Pink Floyd:
You are young and life is long and there is time to kill today.
And then one day you find ten years have got behind you.
No one told you when to run, you missed the starting gun.
So you run and you run to catch up with the sun but it's sinking
Racing around to come up behind you again.
The sun is the same in a relative way but you're older,
Shorter of breath and one day closer to death.
Every year is getting shorter never seem to find the time.
Plans that either come to naught or half a page of scribbled lines
Hanging on in quiet desperation is the English way
The time is gone, the song is over,
Thought I'd something more to say.
Cheguei em casa e me dei conta que não preciso mais guardar meu sapato no closet. Você não está mais aqui pra arranhar o couro. Fui vomitar de nervoso e me dei conta que não preciso mais tampar a privada. Você não está mais aqui pra beber água do vaso. Fui tomar banho e me dei conta que não preciso mais deixar a porta aberta. Você não está mais aqui pra lamber a porta de vidro.
O pior da morte não é o fato. É o cotidiano. São as pequenas coisas que você nem sabia que fazia até você notar que não existem mais. Não precisa mais de dois potes de comida. Não precisa mais de duas caixas de areia. Tem um saco de ração seca que Olivia não come. Não tem mais você pra ficar no meu colo enquanto eu olho Tiago tomar banho. Não tem mais você me dando a pata quando eu sento no sofá pra ver TV. Não tem mais seu miado, seu ronron, seu lamber minha mão como um cachorro.
Liliu me disse "Você agora é um adulto. Você teve que tomar uma decisão difícil e tomou a decisão certa. Você fez tudo que você podia fazer. E agora você está de luto."
Luto. Sempre achei sinônimo de roupa preta. Mas é luta contra a saudade. Beto, não vai ter outro como você. Descanse em paz, meu filho.
Geu,
"Só o tempo...só o tempo alivia esta dor!"
Esta é mais uma frase que ouvimos quando jovens e não compreendemos,até termos necessidade de acreditar nela.
Respire fundo,alinhe sua energia,transforme e mova a dor para um lugar tranquilo.
Um beijo no seu coração!
Posted by: Eda | 26/10/2012 at 05:06 AM